Fonte: Mercados e Eventos – Portal Brasileiro do Turismo – 03/05/2021.
O novo período de baixa demanda de passageiros na aviação doméstica, iniciado em fevereiro, freou a retomada iniciada em setembro e resultou em novas dificuldades para as companhias aéreas brasileiras. Equalizar o preço do bilhete e os custos já era uma tarefa difícil em um cenário de alta demanda de 2019, ano com o maior número de passageiros da história da aviação comercial brasileira, e se tornou quase impossível em meio a crise do coronavírus, com custos altos e pouca procura.
A tarifa doméstica real (ajustada pelo IPCA) teve em 2020 o menor valor da história, R$ 380,48. Em contrapartida, o caixa das companhias foi afetado, além da queda de receitas, pelo aumento de 29% na cotação dólar no ano passado, moeda que compõe cerca de 52% dos custos do setor. Somente até o terceiro trimestre de 2020, as principais companhias do Brasil, Azul, Gol e Latam, haviam acumulado um prejuízo de R$ 19,7 bilhões.
Com este impacto no caixa, a rápida ação de todo o setor no ano passado foi fundamental para evitar a quebra dos principais players do mercado doméstico. Secretaria de Aviação Civil (SAC), Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e Ministério do Turismo trabalharam junto com as companhias para garantir condições de sobrevivência durante a maior crise do setor aéreo. Soma-se ao grupo a Anvisa, que trabalhou em normas que dessem às companhias o aval legal para a implementação de protocolos, como o uso de máscara em voos.
Os acordos, resultaram em medidas como a malha aérea essencial, que permitiu a todos os estados manterem conexões aéreas durante o início da pandemia, o acordo com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom) para a MP 925, que deu o prazo de 12 meses para reembolso de bilhetes, além de negociações com Infraero e com o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DCEA) para flexibilização do pagamento de tarifas.
Para ter uma ideia do alívio de caixa proporcionado por essas medidas, em 2019, o custo dos serviços aéreos somou R$ 43,7 bilhões, de acordo com dados da Anac. Deste total, 7% (R$ 3 bilhões) corresponderam a tarifas de navegação aéreas (4,2%), pagas ao DCEA, e tarifas aeroportuárias (2,8%), pagas à Infraero e concessionárias.
As companhias também tiveram apoio dos estados, com a dispensa das contrapartidas de voos mínimos, prevista nos acordos de redução do ICMS sobre o combustível de aviação (QAV).
Outro ponto fundamental, foi a transformação da MP 925 em lei (14.034/2020), que trouxe uma segurança jurídica, retirando das companhias áreas a responsabilidade por atrasos ou cancelamentos decorrentes de restrições em aeroportos, no espaço aéreo ou por condições meteorológicas, alvo de grande parte dos processos contra as empresas. A medida deu base para reduzir custos com ações judiciais.
MP DO VOO SIMPLES
Essa flexibilização ganhará um reforço, com a chamada MP do Voo Simples, que deve ser publicada pelo governo neste mês de maio. A medida consiste em uma “faxina regulatória” que vai simplificar tarifas, desburocratizar procedimentos e atualizar legislações do setor.
FALTA DE AJUDA FINANCEIRA E IMPOSTO DO LEASING
Se na flexibilização regulatória e no pagamento de tarifas o governo foi fundamental para manter as empresas voando, pelo lado da legislação tributária e e no apoio financeiro o cenário foi diferente. Enquanto os principais grupos aéreos do mundo foram objeto de algum tipo de aporte financeiro de seu governo, aqui isso não ocorreu. Para citar alguns exemplos, Lufthansa, Air France/KLM e TAP, além de todas as companhias dos Estados Unidos, receberam ajuda por meio de compra de ações, aporte direto e até nacionalização.
No Brasil, a alternativa foi a criação de uma linha de crédito junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com a participação de bancos privados. As partes, no entanto, não chegaram a um acordo sobre os moldes. O plano, que previa um pacote de R$ 6 bilhões, esbarrou nas contrapartidas exigidas, como o percentual de participação acionária nas companhias. Chegou-se a cogitar um percentual de 30% no capital das áreas, com base na cotação das ações no segundo trimestre do ano passado, quando apresentavam valores muito abaixo do habitual por conta dos efeitos da pandemia.
Com isso, as principais companhias áreas do país tiveram que encontrar outras alternativas para se sustentar na crise. A Latam Brasil entrou no processo de recuperação judicial da holding, que já corria na justiça dos EUA por meio do Capítulo 11, a Azul emitiu R$ 1,6 bilhão em debêntures conversíveis em ações, enquanto a Gol tomou medidas para conservar o caixa, negociou com fornecedores e, com a segunda onda, anunciou no último dia 28 de abril o aumento de capital de R$ 512 milhões.
Mas não foi só na falta de apoio financeiro que marcou esta parte negativa que criou uma dualidade na atuação do governo, mas também o surgimento do imposto de renda sobre o leasing de aeronaves. Desde 1997, o setor era amparado legalmente com a isenção de imposto, mas ainda no fim de 2019, a Medida Provisória que transformou a Embratur em agência de promoção (MP 907), criou o tributo com um aumento escalonado, iniciando com alíquota de 1,5% em 2020 e subindo para 3% em 2021 e 4,5% de 2022 em diante.
No Congresso o texto foi modificado, zerando a alíquota a partir de 2021. A isenção de imposto, no entanto, foi vetada pelo presidente Jair Bolsonaro, criando um vácuo jurídico e elevando a alíquota para 15%, com base em uma indicação da Receita Federal. Com isso o setor passou a arcar com um imposto que nunca esteve entre oscustos das aéreas brasileiras
Uma nova isenção do imposto chegou a ser anunciada pelo Ministro do Turismo, Gilson Machado Neto, em sua posse, em dezembro do ano passado. O tema será alvo de uma nova MP, que dependia da aprovação do orçamento 2021 para ser publicada.